Essa provavelmente será a última turnê do ex-Beatle, o mesmo já declarou que pretende aproveitar a infância de sua filha caçula, Beatrice. Eu também cuidava do crescer de minha filha em 1990, não fui vê-lo. Havia em mim a irreverência, daquela época. Eu sempre o esperei nas tardes solitárias de domingo, na vitrola destroçada a energia do teu idioma (eu não sabia inglês e ainda não sei) demolia a mesmice da minha vidinha de cidade do interior. Aos 30 e tantos anos sua música fez meu mundo mudar. E mudei. “Por todo o dia eu sou mais eu, sou mais eu, sou mais eu.” (I me mine).
Desculpem-me o caráter intimista do artigo, sou tão memória que mal posso reconhecer onde começa o dia de hoje. Acho que começou em 1967, quando o mundo andava de pernas pro ar. A guerra do Vietnã já rolava por dois anos, Glauber Rocha mostrava as contradições do Brasil em “Terra em Transe”. No teatro, Zé Celso Martinez Corrêa estreou sua famosa montagem de “O Rei da Vela”, no Teatro Oficina. Na música, Caetano Veloso e Gilberto Gil apresentaram “Alegria, Alegria” e “Domingo no Parque”, inaugurando o Tropicalismo. Em cena, a música brasileira misturava o erudito com o popular e se discutia política e estética num dos maiores festivais do Brasil. E Frank Sinatra, curvou-se ao gênio de Tom Jobim, dividindo um disco com ele. Na literatura, o colombiano Gabriel García Márquez consolidava o “realismo mágico” e o boom latino-americano com seu “Cem Anos de Solidão” e o romantismo revolucionário do continente chegava ao fim com a morte, na Bolívia, de Che Guevara, o guerreiro imortalizado no mundo inteiro. Aqui, a ditadura era institucionalizada com AI-5. Só restava-me nas tardes sonolentas, os Beatles.
Eu sonhava em viajar no Yellow Submarine. Como a letra da música Eleonor Rigby cantava: “Todas as pessoas solitárias, de onde elas vêm? Todas as pessoas solitárias, de onde elas são?”. Assim, embalei-me anos entre cantigas, cruzes, desamores e direção incerta.
Nesse domingo você veio me buscar, não trouxe o John, tampouco o George, Ringo preferiu ficar distante de nós. Seu rosto pregado em rugas, sua bochecha meio caída, pareceu-me uma senhora inglesa, só lhe falta um chapeu com flores. O tempo foi implacável até para um ex-Beatle. Eu também, “senhorei-me”, deixei-me levar pelos prazeres da mesa.
No entanto, aos 68 anos, Paul McCartney esbanja boa forma no palco. Vegetariano e único no grupo que poupou-se de exageros no uso de drogas. Ainda esbanjo muito gosto por suas cantigas e percebo que sua plateia tem eternamente 20 e poucos anos assim, como eu.
Sabe Paul, aqui as coisas mudaram, ando sem money, hoje é domingo, tenho que entregar o artigo para o jornal. Não poderei ir vê-lo, sei que “Quando eu ficar mais velha, perdendo meus cabelos. Muitos anos adiante. Você ainda irá me mandar presentes no dia dos namorados” (When I'm Sixty-Four).
Tudo bem, eu me conformo em passar o resto da noite ouvindo Hey Jude e Strawberry fields forever. Mesmo sem nunca ter visto um show desse jovem senhor de 68 anos, permito-me compará-lo ao cometa de Halley, reaparece por aqui, talvez acenando a um outro tempo nosso - e dele - forçando-nos a rever, reavaliar, renascer. Ficamos todos tatuados com a sua presença Sir James Paul McCartney. Até breve!
2 comentários:
Dizer o que...?
Nota 11, maluquinha.
Juanito
Minha Querida Amiga,
Você esta cada dia mais bonita e se mostra de maneira muito clara e livre.
Como você é linda... sinto muita saudade de você.
Mauro
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